Arquivo do mês: outubro 2024

DO ESCAPISMO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

A genialidade do dramaturgo, poeta e filósofo alemão Bertolt Brecht, estrela ofuscante da arte teatral no século 20, condenou o “Escapismo”, lembrando “que continuando a nos omitir da política é tudo o que os malfeitores da vida pública mais querem “.

Brecht deu como exemplo o “analfabeto político”, a pessoa que não ouve, não fala, nem acompanha as ações de governo; – “Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas”, escreveu.

Como verbete dicionarizado, “Escapismo” é um substantivo masculino, significando a tendência de se afastar de situações ruins considerando-se incapaz de resolve-las; é a fuga da realidade ou do cotidiano por meio da abstração, da fantasia. Vem do inglês, “escapism” que no brasilês se formou com escapar + ismo.

Alguns estudiosos atribuem esta palavra ao célebre mágico Harry Houdini, famoso pelo ilusionismo como a arte de escapar de prisões consideradas intransponíveis. Por isto, chamavam-no “escapologista”.

Daí o termo entrou para a cultura contemporânea, expressando-se notadamente na literatura pelo romantismo baseado em situações imaginárias de fuga de problemas aparentemente reais.

No cinema, encontramos a chamada ficção especulativa que traz à telona fantasias, terror e a atraente ficção científica. Especialistas dizem que isto expressa a excelência do “escapismo”.

Aliás, a cultura norte-americana é riquíssima em escapismo, que notadamente se difundiu após a “grande depressão” – a quebra do mercado de ações em 1929. Alan Brinkley, autor do badalado livro sobre este fato que abalou o mundo, “Culture and Politics in the Great Depression”, considera que historicamente foi o escapismo que ajudou o povo norte-americano a atenuar o medo da retração econômica, e escapar mentalmente da pobreza em massa surgida no país.

Assim se viu no jornalismo, nos filmes e matérias radiofônicas. O melhor exemplo é a revista Life, que se tornou popular pelas entrevistas otimistas, reportagens romantizadas sobre os esportes e belas fotos de jovens mulheres na praia. Tudo, menos pobreza e desemprego.

Os EUA escaparam da miséria pelo New Deal de Roosevelt, mas a tendência ao escapismo se revigorou após a Segunda Guerra Mundial e recentemente após o 11 de Setembro. Freud considerou uma dose de fantasia escapista como um elemento necessário na vida dos humanos: “Eles não podem prescindir da satisfação de extorquir da realidade”.

Infelizmente isto é obtido muitas vezes pelo uso de drogas, perversões sexuais e tendência suicida. Constatamos tristemente que isto vem ocorrendo entre nós. Fugir à realidade é rotina e pensamento que grassa entre os mais jovens como motivo para se livrar das decepções e emoções desagradáveis.

A violência reinante social e politicamente, provoca a deserção para se salvar do caldeirão onde ferve a corrupção parlamentar, judicial e dos governos populistas demagógicos que se alternam pela satânica polarização eleitoral.

Não quero que se estabeleça a sociedade dos “Elói” formada por indivíduos indiferentes ao seu entorno, como nos mostrou o filme “A Máquina do Tempo”, baseada no livro de H.G. Wells do mesmo nome; condeno com ardor o escapismo dos que não lutam contra o sistema estabelecido.

Não combater a corrupção, o desleixo na administração pública e a injustiça do “garantismo” do STF na conjuntura que atravessamos, como muitos fazem por conveniência pessoal, covardia ou fanatismo partidário, torna-os cúmplices da maligna realidade criada pelos três poderes republicanos que se misturam diabolicamente.

Muitos desses evadidos da honestidade e do patriotismo estão anestesiados pela imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta, divulgadora do escapismo. A chamada “grande mídia” nos dá o exemplo mais do que perfeito disto, com a descarga de reportagens como vimos na copiosa cobertura televisiva do Rock in Rio….

Influenciam pessoas que, com apenas um ovo da geladeira, se deslocam para as portas dos hotéis e ver os astros impostos pela publicidade. Muito pior! Assim, sofrendo  a lavagem cerebral do escapismo, a massa come nas mãos dos populistas polarizadores, esquecendo a carestia de vida, os altos preços dos remédios, sem Educação, sem Segurança e sem uma Justiça confiável.

Atentem: Não é por acaso que combatem as redes sociais e os seus usuários independentes, que mostram a realidade, que criticam, denunciam e reivindicam.

DA NATUREZA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Numa conferência proferida na Universidade da Califórnia em 1959, Aldous Huxley, o extraordinário intelectual inglês, autor do “Admirável Mundo Novo”, me impressionou fortemente referindo-se à Natureza com três perguntas:

– “Qual a nossa relação com o Planeta? O que estamos fazendo com o mundo no qual vivemos e como estamos tratando esse mundo? Como ele provavelmente nos tratará se continuarmos tratando dessa maneira?”.

São passados 65 anos que esta preocupação foi levada aos pensadores norte-americanos e, como coletânea, editada no livro “A Situação Humana”, alcançou, se não me engano, 54 países de todos continentes.

A inquietação de Huxley com o manto da ansiedade tinha razão de ser pois já causava consideração e dedicação de estudiosos – ambientalistas do século 19 – fazendo pesquisas sobre a relação dos seres humanos com a Natureza.

Reconheceram que a vivência humana na Terra no curso da História, possivelmente há um milhão de anos, a presença do homem sempre foi força da mudança, para melhor e para pior. Registrou-se, então, que a ação humana condicionou o ambiente natural e este, por sua vez, transformou-se, adaptando-se às novas realidades.

O que a humanidade fez de melhor foi o intercâmbio campestre, faunístico e florestal de continente para continente, espalhando árvores frutíferas, gramíneas e tubérculos de uma região para outra, como, por exemplo, o trigo indiano chegou às Américas e a batata andina foi pra Europa…

Esta vivência alcançou os animais domésticos, o carneiro, o cavalo, cabras, galinhas e o gato que saíram do seu habitat original ocupando outros lugares como meio de locomoção e transporte de cargas, como alimento e de estimação.

O lado bom das atividades do homem foi este; o seu reverso está na ação destrutiva do meio ambiente como evidência “civilizatória”, derrubando árvores para fazer carvão e extinguindo várias espécies de animais, como o “pombo viajor” e o bisonte americano; crimes que alcançaram a predação oceânica e fluvial.

Estes episódios depredadores foram lamentáveis na conquista colonial europeia da África, Ásia e América, quando se viu a própria maldade do homem submetendo outro homem com a escravidão indígena e africana.

A barbárie “civilizada” contrastou com a cultura dos povos originários, aros, hauçás, iorubas, uangaras e zulus na África, e nas Américas, maias, astecas, incas, e os mais primitivos, tupis-guaranis brasileiros e peles vermelhas norte-americanos.

Entretanto estes povos mostravam – e os que sobrevivem mostram – a compreensão da defesa do meio ambiente, conservando as terras e os rios, e preservando os reinos animal e vegetal. O seu conhecimento da flora e da fauna era (e é) notável.

Digna de estudo científico é, também, a devastação do meio ambiente pela chamada revolução industrial que se estendeu e generalizou-se mundo afora. A humanidade, por ignorância ou ambição ou cobiça, não se sentiu ameaçada com a expansão acelerada das cidades; e aceitou acomodada os benefícios trazidos pelas descobertas tecnológicas.

A explosão demográfica exigiu mais concentrações urbanas e, consequentemente, mais produções industriais. Assim, o crescimento populacional acelerado na Ásia, África, América Latina e Caribe, exigiu dos governos mais assistência à Saúde e à Educação, coisa que é considerada secundária na política populista, surfando no clientelismo político e na propaganda dos mercenários meios de comunicação de massa.

O quadro que divisamos no Brasil apresenta uma cena de horror. Calou-se a maioria dos ambientalistas pelo abandono governamental da Amazônia, submetidos à distorcida ideologia lulopetista; como também se omitiram os “patriotas” de Bolsonaro. É inegável o desprezo dos dois governos populistas “de Direita” e “de Esquerda”.

Salvo umas e outras exceções, também silenciaram os defensores da Educação Pública não mais agitadores, mais militantes políticos alojados em cargos públicos ou mamando verbas de ONGs fajutas.

Enfim, depois do que se viu na pandemia da Covid, a Saúde Púbica dos populistas que ocuparam e ocupam o poder é um verdadeiro fracasso para o povão; assim como a odiosa exploração dos “planos de saúde” que atendem às classes médias.

Diante desta desgraceira eminente e próxima, a Natureza nos compensa com utilidades, mas nos castiga pelo desprezo dado pela falta de educação ambiental. É com a ajuda dela que denunciamos os mal feitos governamentais, até quando a ditadura judiciária nos permita.

DO CÉREBRO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

A história do cérebro humano mostra que este órgão ficou gradualmente maior em relação ao tamanho do corpo, após a evolução dos primatas para os hominídeos e, finalmente, para o que nós somos hoje.

O caminho percorrido desde anteriores dois milhões de anos, progrediu a partir do Homo erectus, descoberto por Eugène Dubois em Java, na Indonésia, entre 1891 e 1892. Foi classificada como uma espécie asiática, embora tenham sido encontrados fósseis similares na África.

O Homo Erectus já caminhava de forma ereta (daí o seu nome); vivia em pequenos grupos familiares, usava ferramentas de pedra na caça e na coleta, e, provavelmente, dominou o fogo.

Progredindo na linha do tempo, esses ancestrais humanos tinham a capacidade de se comunicar, pois seu cérebro já funcionava comparável à dos humanos modernos; e as pesquisas científicas mostram o cérebro como o centro de controle do corpo, processando informações pelos sentidos, audição, olfato, paladar, tato e visão.

Como verbete dicionarizado, “Cérebro” é um substantivo masculino de etimologia latina “cerĕbru-idem”, órgão anatômico situado na parte anterior e superior do encéfalo, que assume as funções psíquicas, nervosas e a atividade intelectual.

O Cérebro é composto por dois hemisférios (esquerdo e direito) e cinco lobos cerebrais, ficando protegido pelo crânio, suspenso no líquido cefalorraquidiano e isolado da corrente sanguínea pela barreira hematoencefálica.

Atribui-se ao Cérebro a responsabilidade pela atividade natural e especial das emoções, da inteligência, comportamento, linguagem, memória, raciocínio e razão; recebe informações dos sentidos e as processa.

Com esta estrutura, o Cérebro é consequentemente responsável por transmitir os sinais de dor por todo o corpo, mas, em si, não sente dor, limitando-se a satisfazer movimentos corporais e dar pasto aos processos psíquicos que resultam na consciência individual.

É a consciência que leva a pessoa centrar-se na realidade em que vive, e escolher entre servidão ao pensamento dominante ou libertar-se das ilusões e superstições para alcançar a felicidade individual, como pregou Buda.

Como conceito filosófico, a consciência é uma qualidade psíquica, fundamento e modelo de todo o conhecimento, segundo Descartes e o seu truísmo: “penso, logo existo”.

Neste campo da mente e do pensamento humano, o Cérebro é fonte de estudos desde 1882, quando Freud, recém-formado, estudou no Hospital Geral de Viena com Theodor Meynert na clínica psiquiátrica; e, mais tarde, em 1885, com o médico francês Charcot, no Hospital Salpêtrière (Paris, França).

Então surgiu a Psicanálise como método científico descobrindo que os processos psíquicos passam e ficam arquivados de modo inconsciente e assim a Psicologia penetrou na “mitologia do cérebro”, revolvendo a vida psíquica pela análise deste mecanismo.

Todos estamos protagonizando as condições gerais da consciência, por isto, não foi por acaso que Freud escreveu que a humanidade em todo o seu conjunto, era paciente sua. E como pacientes, deitados no divã da curiosidade, estamos nós, conscientes, não integrando a base da massa predisposta ideologicamente à servidão política do culto às personalidades.

Produtos das relações sociais e das suas contradições, somos realmente conscientes das nossas aspirações, coerentemente defensores da liberdade, comportando-nos condizentes na luta contra o oportunismo político e o obscurantismo religioso.

São execráveis a direita reacionária bolsonarista e a enfermiça esquerda lulista, ambas assumindo a ideologia distorcida do populismo.

 

 

 

 

DAS FANTASIAS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Um cristão autêntico que se destaca pela honestidade nas redes sociais, diferente dos oportunistas fraudulentos que se fingem de “religiosos”, comentou o meu artigo DO DILÚVIO, com uma leve crítica; para ele, não importam as fantasias bíblicas, aceita-as por uma questão de fé.

Com todo respeito, respondi-lhe lembrando a minha avó Zulma que tinha os joelhos calejados por ao pé de uma imagem da Santa Terezinha horas seguidas, demonstrando uma imensa fé na estátua de gesso.

Não quis ofendê-lo, pelo contrário, quis mostrar que as questões de fé vêm de tempos muito remotos, na origem das concepções religiosas, com os nossos ancestrais primitivos se relacionando estreitamente com a Natureza e os seus fenômenos.

Como sabemos, as crenças e práticas nunca são de um só homem, mas coletivas de uma sociedade. A Antropologia registra que os primeiros humanos se sociabilizaram; nunca caçaram ou colheram sozinhos, de maneira que o medo e a fé em objetos defensivos ou para “dar sorte” sempre foram comunitários. Assim constatou Freud no seu livro com os “Totens e Tabus”.

A escuridão noturna e os fenômenos fisiológicos do sono e dos sonhos inquietaram e exigiram uma explicação satisfatória; a explicação veio do matemático, escritor, filósofo e teólogo francês, Blaise Pascal, concebendo que tais preocupações levaram à invenção da alma.

Assim temos o Animismo, a “religião de fraldas”, nas tribos primitivas, limitando-se ideologicamente ao baixo desenvolvimento produtivo, que deu mais força às relações entre as pessoas e mais estreitas e ajustadas com a Natureza reinante.

A partir daí, a História mostra que paralelamente às manifestações religiosas surgiu a sua exploração comercial com a venda de artefatos, objetos de arte, monumentos funerários e imagens de barro ou madeira figurando deuses. Criou-se assim a indústria da idolatria.

Daí em diante a arqueologia vem revelando que o sentimento religioso tomou a direção subjetiva da transferência da divindade incorpórea e inatingível para os monumentos e as inscrições petróglifas (mais tarde pergaminhos e livros) atribuindo a estes um poder mágico aos fetiches.

O avanço civilizatório trouxe uma nova percepção na antiga Grécia nos anos 400 a.C., quando o filósofo e matemático Pitágoras imaginou e pregou a conexão e a união entre a alma individual e a alma divina, com a crença de uma “alma abrangente” de humanos, animais e até de objetos.

Assiste-se a partir de então a evolução vinda desde o primeiro estágio religioso da humanidade até a crença da alma, herança deixada pelos avoengos da cultura ocidental.

No Ocidente, porém, sofremos um processo regressivo da idolatria quando o cristianismo se tornou a religião imperial e a Igreja Católica Romana para atrair devotos, usou ídolos, inclusive apresentando a deusa Isis como se fosse Maria, mãe de Jesus, coroada como “rainha do céu”.

Constata-se mesmo assim que muitas pessoas já não se ajoelham diante de ídolos e imagens colocadas para serem venerados no lugar de Deus e dos santos. A imaterialidade da alma, pregada por Pitágoras, depois aceita e desenvolvida por Spinoza, ensina que Deus e a Natureza são a mesma e única coisa.

Na velha Grécia de Platão e Sócrates, Pitágoras foi condenado ao exílio e teve os seus escritos queimados; e Spinoza foi punido pelas autoridades religiosas judaicas sendo repudiado socialmente. Estas penas exemplificam a intolerância reacionária.

Intolerância presente ainda hoje, em pleno século 21, surfando ultrapassada sobre a massa ignara, e ainda vemos ídolos cultuados em lugar de Deus; o pior, muito pior mesmo, é que essa adoração totêmica se sobrepôs ao religioso, chegando ao culto à personalidade de políticos, como vimos no século passado nos países totalitários e, infelizmente, se estendeu à realidade atual.

A fantasia grotesca dessa decadência intelectual, deixada por Hitler, Mussolini e Stálin, idolatrados pela estupidez dos seus seguidores, revive no Brasil com o fanatismo de baixo QI por Bolsonaro e Lula….